Uma equipe de cientistas brasileiros
liderada pelo farmacêutico Luiz Pianowski está perto do que pode ser um
sinalizador para a cura da aids, informa o Valor Econômico. Segundo o jornal,
as pesquisas conduzidas por esse grupo já se encaminham para a fase de
conclusão de estudos pré-clínicos. No jargão farmacêutico, isso significa que
testes serão realizados em animais - nesse caso, em macacos Rhesos, a mesma
espécie de primatas na qual foi testado e descoberto o fator Rh do sangue -
para apurar a eficácia e saber as contraindicações desse possível medicamento.
Leia mais a seguir:
A pesquisa começou meio que por acaso, quando o empresário cearense Everardo Ferreira Telles, ex-dono da cachaça Ypióca (cuja marca e uma parte dos ativos da companhia foram vendidos para grupo britânico de bebidas Diageo), decidiu financiar estudos científicos sobre a eficácia da planta aveloz no tratamento de câncer. "Ouvi vários relatos de pessoas do Nordeste que foram curadas pelo aveloz. Decidi encarar esse desafio e financiar as pesquisas", disse o empresário ao Valor.
No Norte e Nordeste, feiras livres e até farmácias vendem "garrafadas", poções compostas de ervas, com fama de curar os mais diferentes males. Entre elas está a "garrafada" de aveloz - Euphorbia tirucalli, planta nativa da África do Sul que lembra um cacto - também conhecida como árvore-do-lápis, cega-olho e espinho-italiano, considerada eficaz para os casos de câncer. A crendice é alimentada com a argumentação de que alguns medicamentos desenvolvidos por grandes multinacionais voltados para o tratamento do câncer têm origem em moléculas extraídas de plantas. Importantes remédios, como o Tamiflu (da suíça Roche), para o combate da gripe H1N1, vêm do anis estrelado, por exemplo. Alguns produtos para o coração, e até a famosa Aspirina, da alemã Bayer, fazem parte da extensa lista de produtos extraídos de plantas.
Pelo sim, pelo não, Telles decidiu levar o projeto adiante. O empresário, que não tem nenhuma familiaridade nessa área, criou a empresa Amazônia Medicamentos Ltda., na qual é o maior acionista, para bancar os estudos. "Já investimos cerca de R$ 50 milhões e podemos colocar mais outro tanto para financiar as pesquisas."
O empresário contratou o cientista paranaense Luiz Pianowski, farmacêutico de formação, com especialização em fitomedicamentos (de origem vegetal) na cidade do Porto (Portugal), para conduzir as pesquisas no Brasil. Alto e "um tanto gordo", como ele mesmo se define, o pesquisador passou por importantes empresas farmacêuticas no país, antes de montar seu próprio QG de pesquisa, a Kyolab, em Valinhos (SP), onde foi contatado por Telles.
Antes de seguir carreira solo, Pianowski desenvolveu fitomedicamentos para o laboratório Hebron, de Pernambuco, e para a farmacêutica Aché, uma das maiores de capital nacional, cujo carro-chefe é o anti-inflamatório Acheflan, de que é um dos detentores da patente.
Ao Valor, Pianowski disse que começou a pesquisa focada no câncer em 2003. Mas, no meio do caminho, percebeu que as moléculas extraídas do aveloz também apontavam para outras duas linhas de tratamento - combate ao vírus HIV e à dor crônica. O estudo, então, se dividiu em três - AM10 (câncer), AM11 (dor) e AM12 (Aids). Para ajudá-lo nesse trabalho, o pesquisador se cercou de acadêmicos brasileiros - João Batista Calixto (Universidade Federal de Santa Catarina, UFSC), João Ernesto Carvalho (Unicamp), Odorico de Moraes (Universidade Federal do Ceará, UFCE), Vera Redher (Unicamp), Auro Giglio (vinculado ao Hospital Albert Einstein).
No caso do AM12, voltado para a Aids, os pesquisadores detectaram que a substância extraída da planta (ingenol) age deslocando o vírus de dentro da célula infectada, levando-a à morte (apoptose). Com isso, o vírus é exposto aos antirretrovirais existentes. Em tese, isso poderia significar a cura da Aids, uma vez que a substância mata a célula infectada. "Os atuais tratamentos só agem matando o vírus quando ele se multiplica e sai da célula invadida para entrar em outras", disse Pianowski.
Estudos começaram com foco no câncer e se desdobraram em duas novas linhas de tratamento: HIV e dor
Grupos farmacêuticos internacionais já pesquisaram mais de dois milhões de substâncias tentando chegar a essa mesma ação. Porém, as poucas moléculas que conseguiram quebrar a latência da célula, ou seja, extrair o vírus, foram consideradas altamente tóxicas. O AM12 tem demonstrado baixa toxicidade na dose eficaz.
Para levar o estudo adiante, a equipe de cientistas contatou as empresas americanas Bioqual e o conceituado centro de virologia do Instituto Johns Hopkins para conduzir os testes em animais. Se ficar comprovada a baixa toxicidade no organismo do animal, a pesquisa passa para a próxima fase, quando são feitas experiências em humanos. Paralelamente a essa linha de estudos, a equipe também observou que a substância AM12 pode se ligar a receptores celulares, impedindo que o vírus HIV "ataque" outras células de defesa sadias.
De acordo com Lúcio Gama, professor instrutor do Departamento de Patobiologia Molecular e Comparada da Escola de Medicina do Instituto Johns Hopkins, em Baltimore (EUA), serão testadas duas drogas isoladas pela equipe do Pianowski. "Vamos usar células de macacos para que possamos utilizar essas substâncias no futuro em animais infectados com o SIV [o HIV dos macacos] em combinação com o coquetel antirretroviral."
Segundo Gama, o laboratório está fazendo os experimentos "in vitro" apenas nas células. "A Bioqual [companhia privada americana] fará os experimentos em macacos. Vai providenciar macacos infectados pelo SIV e em tratamento antirretroviral, administrar a nova droga em conjunto com o coquetel, além de monitorar os animais. Amostras de sangue serão coletadas semanalmente e uma pequena quantidade será mandada para nós aqui no Hopkins para algumas avaliações", afirmou. Procurada, a Bioqual não retornou aos pedidos de entrevista.
A evolução desses estudos somente será levada adiante se as contra-indicações não forem mais danosas que os benefícios que o possível medicamento poderá trazer. A expectativa dos cientistas brasileiros é grande. Nos próximos quatro a seis meses, esses resultados serão divulgados. Se forem positivos, um grupo de pacientes voluntários testará o medicamento.
Leia mais a seguir:
A pesquisa começou meio que por acaso, quando o empresário cearense Everardo Ferreira Telles, ex-dono da cachaça Ypióca (cuja marca e uma parte dos ativos da companhia foram vendidos para grupo britânico de bebidas Diageo), decidiu financiar estudos científicos sobre a eficácia da planta aveloz no tratamento de câncer. "Ouvi vários relatos de pessoas do Nordeste que foram curadas pelo aveloz. Decidi encarar esse desafio e financiar as pesquisas", disse o empresário ao Valor.
No Norte e Nordeste, feiras livres e até farmácias vendem "garrafadas", poções compostas de ervas, com fama de curar os mais diferentes males. Entre elas está a "garrafada" de aveloz - Euphorbia tirucalli, planta nativa da África do Sul que lembra um cacto - também conhecida como árvore-do-lápis, cega-olho e espinho-italiano, considerada eficaz para os casos de câncer. A crendice é alimentada com a argumentação de que alguns medicamentos desenvolvidos por grandes multinacionais voltados para o tratamento do câncer têm origem em moléculas extraídas de plantas. Importantes remédios, como o Tamiflu (da suíça Roche), para o combate da gripe H1N1, vêm do anis estrelado, por exemplo. Alguns produtos para o coração, e até a famosa Aspirina, da alemã Bayer, fazem parte da extensa lista de produtos extraídos de plantas.
Pelo sim, pelo não, Telles decidiu levar o projeto adiante. O empresário, que não tem nenhuma familiaridade nessa área, criou a empresa Amazônia Medicamentos Ltda., na qual é o maior acionista, para bancar os estudos. "Já investimos cerca de R$ 50 milhões e podemos colocar mais outro tanto para financiar as pesquisas."
O empresário contratou o cientista paranaense Luiz Pianowski, farmacêutico de formação, com especialização em fitomedicamentos (de origem vegetal) na cidade do Porto (Portugal), para conduzir as pesquisas no Brasil. Alto e "um tanto gordo", como ele mesmo se define, o pesquisador passou por importantes empresas farmacêuticas no país, antes de montar seu próprio QG de pesquisa, a Kyolab, em Valinhos (SP), onde foi contatado por Telles.
Antes de seguir carreira solo, Pianowski desenvolveu fitomedicamentos para o laboratório Hebron, de Pernambuco, e para a farmacêutica Aché, uma das maiores de capital nacional, cujo carro-chefe é o anti-inflamatório Acheflan, de que é um dos detentores da patente.
Ao Valor, Pianowski disse que começou a pesquisa focada no câncer em 2003. Mas, no meio do caminho, percebeu que as moléculas extraídas do aveloz também apontavam para outras duas linhas de tratamento - combate ao vírus HIV e à dor crônica. O estudo, então, se dividiu em três - AM10 (câncer), AM11 (dor) e AM12 (Aids). Para ajudá-lo nesse trabalho, o pesquisador se cercou de acadêmicos brasileiros - João Batista Calixto (Universidade Federal de Santa Catarina, UFSC), João Ernesto Carvalho (Unicamp), Odorico de Moraes (Universidade Federal do Ceará, UFCE), Vera Redher (Unicamp), Auro Giglio (vinculado ao Hospital Albert Einstein).
No caso do AM12, voltado para a Aids, os pesquisadores detectaram que a substância extraída da planta (ingenol) age deslocando o vírus de dentro da célula infectada, levando-a à morte (apoptose). Com isso, o vírus é exposto aos antirretrovirais existentes. Em tese, isso poderia significar a cura da Aids, uma vez que a substância mata a célula infectada. "Os atuais tratamentos só agem matando o vírus quando ele se multiplica e sai da célula invadida para entrar em outras", disse Pianowski.
Estudos começaram com foco no câncer e se desdobraram em duas novas linhas de tratamento: HIV e dor
Grupos farmacêuticos internacionais já pesquisaram mais de dois milhões de substâncias tentando chegar a essa mesma ação. Porém, as poucas moléculas que conseguiram quebrar a latência da célula, ou seja, extrair o vírus, foram consideradas altamente tóxicas. O AM12 tem demonstrado baixa toxicidade na dose eficaz.
Para levar o estudo adiante, a equipe de cientistas contatou as empresas americanas Bioqual e o conceituado centro de virologia do Instituto Johns Hopkins para conduzir os testes em animais. Se ficar comprovada a baixa toxicidade no organismo do animal, a pesquisa passa para a próxima fase, quando são feitas experiências em humanos. Paralelamente a essa linha de estudos, a equipe também observou que a substância AM12 pode se ligar a receptores celulares, impedindo que o vírus HIV "ataque" outras células de defesa sadias.
De acordo com Lúcio Gama, professor instrutor do Departamento de Patobiologia Molecular e Comparada da Escola de Medicina do Instituto Johns Hopkins, em Baltimore (EUA), serão testadas duas drogas isoladas pela equipe do Pianowski. "Vamos usar células de macacos para que possamos utilizar essas substâncias no futuro em animais infectados com o SIV [o HIV dos macacos] em combinação com o coquetel antirretroviral."
Segundo Gama, o laboratório está fazendo os experimentos "in vitro" apenas nas células. "A Bioqual [companhia privada americana] fará os experimentos em macacos. Vai providenciar macacos infectados pelo SIV e em tratamento antirretroviral, administrar a nova droga em conjunto com o coquetel, além de monitorar os animais. Amostras de sangue serão coletadas semanalmente e uma pequena quantidade será mandada para nós aqui no Hopkins para algumas avaliações", afirmou. Procurada, a Bioqual não retornou aos pedidos de entrevista.
A evolução desses estudos somente será levada adiante se as contra-indicações não forem mais danosas que os benefícios que o possível medicamento poderá trazer. A expectativa dos cientistas brasileiros é grande. Nos próximos quatro a seis meses, esses resultados serão divulgados. Se forem positivos, um grupo de pacientes voluntários testará o medicamento.
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