Por Natasha
Romanzoti em 13.03.2013 as 16:00
Quando se trata de saúde pública, há pouca margem
para erro. As repercussões podem ser sérias, para não dizer mortais, e
permanecer por muito tempo na memória da população.
Embora os avanços
tecnológicos e legislativos tenham ajudado a acabar com alguns problemas na
área médica, recentes casos de grande repercussão mostram que na indústria
farmacêutica altamente competitiva e orientada a lucros – e na área de saúde
pública mais amplamente – crises e escândalos continuam a ser uma ameaça para
nós.
De erros genuínos
a histeria movida pela mídia e enganos intencionais e até mesmo maliciosos,
confira escândalos médicos e outros desastres de saúde da história da medicina:
10. Vacina
MMR e autismo
Reclamações sobre
a ligação da vacina MMR (para sarampo, caxumba e rubéola) com autismo fizeram
manchetes no Reino Unido no final dos anos noventa. Em 1998, o cirurgião e
pesquisador inglês Andrew Wakefield liderou um grupo que publicou um artigo na
altamente conceituada revista médica Lancet mostrando evidências que ligavam a
vacina a transtornos de desenvolvimento.
As reivindicações
de Wakefield levaram a uma série de estudos importantes, e nenhum dos quais
provou qualquer ligação. No entanto, o artigo já havia incitado um frenesi da
mídia e levou a prejuízos, processos, além de prejudicar a saúde das crianças
cujas mães ficaram com medo de vaciná-las. Preocupações sobre a vacinação chegaram
até mesmo em outros países, como os Estados Unidos e o Japão.
Com a diminuição
das taxas de vacinação MMR registrada no Reino Unido e na Irlanda, houve
aumentos significativos de casos de – e mortes relacionadas com – caxumba e
sarampo. Em 2004, uma investigação revelou finalmente que Wakefield havia
manipulado as evidências de seu “trabalho cientifico”, além de ter vários
conflitos de interesses que não foram divulgados. O artigo foi totalmente
retirado de publicação em 2010, mesmo ano em que Wakefield foi expulso do
General Medical Council. O consenso
científico agora afirma que não há ligação entre o autismo e a vacina MMR.
9. Esquema
de transplante de rim ilegal
Em 2008, a Índia
ficou chocada quando um esquema de transplante de rim ilegal foi exposto na
cidade de Gurgaon, no estado de Haryana. Descobriu-se que centenas de
trabalhadores pobres foram intimidados por homens armados ou enganados a “doar”
órgãos, e as autoridades acreditavam que os destinatários tinham sido indivíduos
ricos – incluindo estrangeiros.
Ao longo de um
período de 10 anos, cerca de 600 transplantes de rins foram realizados numa
casa particular equipada com alta tecnologia médica. Depois de uma batida
policial em janeiro de 2008, vários criminosos foram presos e cinco doadores
involuntários salvos e transferidos para um hospital próximo.
Surpreendentemente, foi descoberto mais tarde que no mínimo de dois hospitais
estavam envolvidos no esquema.
Pensa-se que as
vítimas recebiam uma oferta de cerca de 50.000 rúpias (R$ 1.820) pelos seus
rins. Se elas recusassem, eram drogadas e seus órgãos removidos à força, e
vendidos mais tarde por até 10 vezes o preço acima mencionado. Logo após a
invasão policial, alguns receptores de rim foram detidos, incluindo três cidadãos
gregos e um casal indiano que morava nos EUA.
8. O cavalo
Jim e o tétano
A contribuição do
cavalo Jim para salvar vidas no final do século 19 não pode ser questionada. O
soro sanguíneo do animal foi concebido para produzir a antitoxina da difteria e
usado para fabricar mais de 26,5 litros de anticorpos utilizados contra essa
doença contagiosa do trato respiratório, potencialmente mortal especialmente
para crianças pequenas.
Em seguida, no
início de outubro de 1901, Jim recebeu uma péssima notícia: tinha contraído
tétano. Por conta disso, teve que ser sacrificado. Na mesma época, no entanto,
uma menina de St. Louis (EUA) morreu, e descobriu-se que o soro de Jim tinha
causado sua morte. Posteriormente, foi revelado que o soro retirado do cavalo
de 30 de setembro em diante estava infectado com tétano em fase de incubação.
As amostras não
tinham sido testadas – um processo que poderia facilmente ter descoberto a
infecção. Além disso, frascos de soro obtidos em 30 de setembro haviam sido
marcados como “24 de agosto”, erro que custou a vida de mais 12 crianças. O
episódio contribuiu em parte para a criação de uma lei de controle biológico
nos Estados Unidos em 1902, e abriu o caminho para a introdução da
Administração de Drogas e Alimentos americana (FDA, na sigla em inglês) em
1906.
7. Recall
de heparina
Em 2008, a FDA
anunciou um recall em grande escala do medicamento heparina, após descobrir
lotes contaminados da droga que haviam sido fabricados na China pela Scientific
Protein Laboratories, uma empresa dos EUA. A heparina é injetada em muitas
pessoas para prevenir coágulos sanguíneos e é derivada de tecidos de animais
abatidos, como intestinos de vacas e pulmões de porcos.
O recall seguiu
relatórios que alegavam que 81 mortes e 785 lesões graves estavam ligadas à droga.
Investigações identificaram um contaminante no medicamento, derivado de sulfato
de condroitina, que pode ser utilizado como suplemento dietético, mas não como
remédio. Pior de tudo: várias razões levaram as autoridades a crer que a
contaminação foi deliberada, incluindo o fato de que o contaminante imita o
efeito da heparina, mas custa apenas uma fração do seu preço.
O motivo para a
contaminação foi provavelmente uma combinação de corte de custos e falta do
tipo certo de porco na China. No início de 2012, a FDA adicionou 22
fornecedores chineses de ingredientes de heparina a uma lista de alerta, e
declarou que não tem dinheiro nem poder suficiente para inspecionar tais
fabricantes no exterior em uma base regular.
6. Desastre
do “elixir de sulfanilamida”
A Lei Federal de
Alimentos, Medicamentos e Cosméticos (FDCA) dos EUA entrou em vigor em 1938, e
deu à FDA o poder de supervisionar a segurança de alimentos, medicamentos e
cosméticos no país. De certa forma, o desastre “elixir de sulfanilamida” de
1937 (e o clamor público que gerou) contribuíram para sua realização.
Mais de 100
pessoas foram envenenadas e morreram quando sulfanilamida, um antibiótico, foi
dissolvido em dietilenoglicol (DEG) e comercializado como Elixir de
Sulfanilamida. Apesar de relatos indicarem que o DEG era perigoso para seres
humanos, tal informação não era amplamente conhecida, e o farmacêutico-chefe da
fabricante de medicamentos S. E. Massengill fazia parte da maioria
desinformada. Na época, não havia regras que exigiam testes de segurança em
novos medicamentos antes de irem à venda. E, enquanto empresas farmacêuticas
faziam rotineiramente testes em animais, a Massengill não tinha realizado
nenhum neste caso.
Logo após o elixir
com sabor framboesa chegar ao mercado em setembro de 1937, houve relatos de
mortes. Investigações posteriores isolaram a causa. O escândalo levou à
aprovação da FDCA, mas a companhia Massengill só foi sujeita a uma multa mínima
devido às estipulações da lei anterior, de 1906. Ainda assim, com julgamento
pendente, o farmacêutico-chefe tirou a própria vida.
5. Falta de
higiene e meningite fúngica
Em outubro de
2012, o Centro para Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos EUA seguiu a
trilha de um surto de meningite fúngica à contaminação de medicamentos
administrados como injeções esteroides epidurais. Empacotado e vendido pela
farmácia com sede em Massachusetts (EUA) New England Compounding Center (NECC),
os medicamentos estragados tinham sido enviados para 75 clínicas, hospitais e
centros cirúrgicos em 23 estados americanos. Entre maio e setembro do mesmo ano,
cerca de 14 mil pacientes receberam a medicação.
Enquanto as
pessoas relataram sintomas em agosto, a infecção era tão estranha que uma causa
comum não foi suspeita até o mês seguinte. Na verdade, os casos de meningite
atribuídos às variedades de fungos implicados eram tão raros que sua descoberta
e tratamento médico exploraram território novo.
Em meados de
janeiro de 2013, 678 pessoas haviam contraído a doença fúngica e 44 morreram.
Investigações preliminares descobriram que falta de higiene no NECC era a culpada
pelo surto. Autoridades descobriram que o NECC havia distribuído a droga apesar
de ainda estar esperando resultados de testes que indicariam se o lote estava
ou não estéril. Até 15 de dezembro de 2012, mais de 400 processos judiciais
foram lançados contra a empresa.
4.
Implantes explosivos
Fundada em 1991, a
empresa francesa Poly Implant Prothese (PIP) vendeu implantes mamários por
quase duas décadas. Em seu auge, fabricou 100.000 implantes por ano, fornecendo
um total estimado de 400.000 mulheres em todo o mundo. Então, em 2009,
cirurgiões franceses começaram a relatar números altos de implantes PIP que
tinham rompido.
Os acontecimentos
que se desenrolaram foram dramáticos. Verificou-se que, em 2001, a PIP tinha
começado a usar silicone de grau industrial não autorizado na fabricação da
maior parte de seus implantes, em vez do silicone de grau médico recomendado.
Isto reduz o custo de fabricação dos implantes por 90%, mas aumenta a
possibilidade de ruptura, que pode causar inflamação, irritação e liberação de
substâncias tóxicas no corpo. E, enquanto não houve nenhuma relação comprovada
ainda, 20 mulheres com implantes franceses supostamente defeituosos foram
diagnosticadas com câncer.
As autoridades
francesas recomendaram
que as mulheres do mundo todo com implantes PIP os removessem. De 672 remoções
preventivas registradas, os implantes tinham estourado em 43 casos (até
dezembro de 2011). O escândalo provocou uma onda de reclamações legais que
levaram à falência da PIP em 2009 e a eventual liquidação da empresa dois anos
depois.
3. Xarope
venenoso
Em 2007, 70 anos
depois do infame escândalo do Elixir de Sulfanilamida nos EUA, um surto
semelhante causou a trágica perda de centenas de vidas no Panamá. Fabricantes
de produtos farmacêuticos utilizaram dietilenoglicol, comumente usado em
anticongelantes e fluido de freio, para fazer xarope para tosse, acreditando
equivocadamente que era glicerina. O ingrediente levou a nada menos do que 365
mortes no país, e foi rastreado até a China.
Descobriu-se que o
dietilenoglicol importado utilizado foi originalmente denominado “TD
glicerina”, que na China aparentemente indica que é um substituto de glicerina.
A China negou qualquer responsabilidade pelo escândalo, já que o nome do
produto foi alterado para “glicerina” na chegada do líquido ao Panamá. No
entanto, o jornal americano The New York Times descobriu mais tarde que o
fabricante chinês não era sequer licenciado para fazer ingredientes
farmacêuticos.
Além disso, este
tipo de contaminação não é incomum. Em 2009, foi relatado que 84 bebês, se não
mais, morreram na Nigéria após ingerir xarope para a tosse que também se
acredita ter sido contaminado com dietilenoglicol.
2. Sangue
sem tratamento térmico e AIDS
O Japão não teve
nenhum relato oficial de HIV até 1985, quatro anos após a doença ser
identificada em Los Angeles. Em 1983, o Ministério de Saúde do Japão foi informado
sobre um produto de sangue tratado termicamente licenciado nos EUA que podia
matar o HIV (tornando sangue utilizado medicamente mais seguro). Quando
aberturas foram feitas para licenciar o produto no Japão, o principal
fornecedor de produtos derivados do sangue do país, a Green Cross Corporation,
contestou fortemente, afirmando que o produto seria uma concorrência desleal
(já que eles se recusavam a explorar alternativas tratadas termicamente).
O produto não foi
licenciado, e o Ministério da Saúde japonês agiu ordenando que os produtos de
sangue japoneses não tratados fossem rastreados e que fossem feitos testes
sobre tratamento térmico, incentivando o público a doar sangue. Enquanto isso,
a Green Cross Corporation garantiu a segurança de seus produtos sanguíneos sem
tratamento térmico para os pacientes – um número significativo dos quais tinha
hemofilia – e a decisão foi desastrosa.
Durante este
período de tempo, pensa-se que até 2.000 pacientes hemofílicos contraíram HIV
através de produtos sanguíneos contaminados. Funcionários proeminentes do
Ministério de Saúde do país, um médico e executivos da empresa foram mais tarde
acusados de homicídio culposo (sem intenção de matar).
1.
Talidomida e defeitos congênitos
O escândalo de
distribuição da talidomida
dos anos 1950 e início dos anos 1960 deixou um efeito duradouro sobre o
mundo. Lançado como um medicamento sedativo no final da década de 1950, a
talidomida se mostrou eficaz para amenizar os efeitos de ânsia de gravidez. A
droga foi vendida a partir de 1957, mas retirada do mercado em 1962, quando se
descobriu que era capaz de interferir com o desenvolvimento de fetos, causando
defeitos congênitos.
Inicialmente, a
talidomida foi considerada uma “droga maravilha”. Na época, o uso de
medicamentos durante a gravidez não era bem regulado. Drogas não eram
devidamente testadas para o possível perigo que representavam para os bebês no
útero. Naquela época, os cientistas nem sequer pensavam que medicamentos
tomados por uma mulher grávida podiam prejudicar o feto em crescimento. Em
última análise, milhares de mulheres grávidas tomaram a talidomida durante seus
cinco anos no mercado – e os efeitos foram horrendos.
Através de 46
países, mais de 10.000 crianças nasceram com defeitos como focomelia. Este
distúrbio geralmente resulta em anormalidades nos braços e pernas, mas pode também
ter um impacto sobre outras partes do corpo. Só no Reino Unido, cerca de 2.000
bebês nasceram com defeitos congênitos resultantes da talidomida; cerca de
1.000 morreram dentro de alguns meses, enquanto 466 dos afetados ainda estavam
vivos em 2010. A empresa alemã Grünenthal Group, que criou a droga, emitiu um
pedido de desculpas em 2012, mais de 50 anos depois que a droga começou a ser
vendida.[TMIPHD]
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