23/10/201218h47
Quando o filho de Julie Auslander ficou doente e não
conseguia tomar suas pílulas, a mãe recorreu a um farmacêutico, que manipulou
adesivos com o medicamento para o menino. Alguns anos mais tarde, quando a mãe
de Auslander não conseguia engolir os ansiolíticos que precisava tomar após uma
leucemia, a filha recorreu novamente ao farmacêutico, que preparou um tablete
especial que se dissolvia sob a língua da paciente.
Em ambos os casos, Auslander, uma empresária de 53 anos de
Montvale, Nova Jersey, examinou de perto o trabalho da farmácia de manipulação.
"Quis saber como tudo era feito, assim como com
qualquer outra coisa que compro", afirmou. "Não sou capaz de fazer o
mesmo trabalho do FDA, mas só de ver as condições do lugar, posso ter uma ideia
do que estou comprando."
Mesmo que a maioria das pessoas compre antibióticos ou
remédios para combater o diabetes diretamente nas farmácias, algumas receitas
precisam ser misturadas ou alteradas – um processo conhecido como manipulação
–, para se adaptarem às necessidades individuais.
Medicamentos feitos apenas para adultos geralmente são
manipulados para crianças, ou transformados em chicletes ou líquidos com aroma
de uva. Fórmulas sem corantes ou glúten podem ser feitas para pacientes com
alergias; remédios com sabor de frango ou peixe podem ser manipulados para
gatos e cachorros. Praticamente todos os hospitais com unidades de terapia
intensiva possuem farmácias de manipulação que preparam medicamentos para os
pacientes.
Entretanto, um grande lote de analgésico injetável
manipulado por uma farmácia de Massachusetts estaria contaminado com um fungo
que causou uma epidemia de meningite em muitos Estados. Ao menos 15 pessoas
morreram e mais de 200 estão doentes. Ainda que, nos Estados Unidos, as farmácias
de manipulação sejam regulamentadas por órgãos estaduais, cujos padrões variam,
o episódio renovou o debate sobre a falta de regulamentação do setor e das
diversas farmácias que se transformaram em pequenas indústrias farmacêuticas.
Quando os médicos prescrevem remédios manipulados em escala
ambulatorial, os pacientes geralmente são indicados diretamente a uma farmácia
capaz de realizar o pedido, mas muitos deles não sabem que estão recebendo
medicamentos manipulados.
"As bolsas para administração intravenosa que ficam ao
lado dos leitos – não todas, mas grande parte – são manipuladas na farmácia do
hospital", afirmou Anne Burns, vice-presidente sênior de assuntos
profissionais da Associação Americana de Farmacêuticos. Os agentes
quimioterápicos administrados em clínicas ou consultórios médicos também são
manipulados para se adaptarem às necessidades e ao peso dos pacientes, afirmou.
"Como em um hospital, quando pacientes recebem remédios manipulados dos
médicos, provavelmente não sabem o que estão tomando", afirmou Burns.
Com frequência, até mesmo os médicos de hospitais não sabem
de onde os remédios vieram, se foram comprados em farmácias de manipulação ou
de grandes laboratórios, afirmou Michael Carome, diretor interino de pesquisa
médica no observatório Public Citizen.
O surto de meningite demonstra que os pacientes precisarão
começar a perguntar sobre a fonte dos medicamentos que recebem, afirmou.
Segundo os especialistas, a manipulação é apropriada desde
que a fórmula tenha sido preparada especificamente para o paciente, com base na
prescrição médica, contendo medicamentos aprovados pelo FDA e que não estejam à
disposição no mercado.
Mas o centro de manipulação de Massachusetts parece ter
agido antes como uma indústria farmacêutica não regulamentada. O analgésico
manipulado, um esteroide que pode ser injetado na espinha dorsal, foi enviado
para 23 Estados e administrado a mais de 14.000 pacientes.
"A produção de mais de 17.000 unidades do esteroide
deixou claro que o centro estava agindo fora de seu escopo de atuação",
afirmou Marcus Ferrone, professor adjunto de farmacologia clínica na
Universidade da Califórnia, em São Francisco, e diretor do Drug Products
Service Laboratory, que manipula medicamentos e dá cursos para estudantes de
farmácia.
Outro sinal de que algo estava errado era a data de validade
dos medicamentos nos frascos. Fotografias publicadas na mídia mostram que a
data de validade impressa em alguns dos frascos era seis de fevereiro de 2013.
"A indústria farmacêutica gasta muito tempo para
determinar as datas de validade, mas as farmácias de manipulação não podem
fazer isso", afirmou Ferrone. "Não temos acesso a esse tipo de
informação."
Ferrone não quis fazer comentários específicos sobre o
medicamento que causou o surto, mas afirmou que produtos estéreis de alto risco
utilizados em injeções dorsais e nutrição parenteral "recebem um prazo de
validade de apenas 24 horas".
O farmacêutico afirmou que os pacientes devem questionar
"não apenas se o medicamento foi manipulado, mas se todos os procedimentos
são feitos no mesmo local". Segundo ele, caso o medicamento seja
manipulado em outro lugar, a próxima questão deveria ser: "Quem
supervisionou a produção e os procedimentos de qualidade do fornecedor
externo?".
Os pacientes precisam ficar especialmente ligados com os
medicamentos administrados por via intravenosa ou injeção, pois devem ser
preparados sob condições estéreis.
Ainda que o trato gastrintestinal possua mecanismos para
combater bactérias e outros contaminantes, "mas quando são injetados
diretamente no sistema circulatório, há menos opções", afirmou Cynthia
Reilly, diretora da divisão de desenvolvimento de práticas da Sociedade
Americana de Farmacêuticos do Sistema de Saúde.
Reilly e outros especialistas ofereceram mais alguns
conselhos a respeito dos medicamentos manipulados.
– Pergunte a seu médico se o medicamento precisa de
manipulação e, caso precise, pergunte por que e se existem medicamentos
aprovados pelo FDA que possam ser adquiridos diretamente nas farmácias – mesmo
que sejam mais caros. Caso precise de um remédio específico, escolha a farmácia
de manipulação da mesma forma que escolhe os demais fornecedores de cuidados
com a saúde. Peça recomendações, mas assegure-se de que o local possui o
licenciamento estadual e nunca foi penalizado por irregularidades.
– Questione a respeito da formação dos farmacêuticos e se
são credenciados. Vá até a farmácia e conheça as instalações.
– Pergunte ao farmacêutico se ele está habituado a manipular
seu medicamento e se já fez isso antes. Peça indicações sobre o armazenamento e
a utilização do produto e não se esqueça de perguntar sobre os efeitos
colaterais, os riscos e as contraindicações.
– Confira se há notificações pelo não cumprimento de regras
no site do FDA.
Entretanto, a autoridade da agência sobre as farmácias de
manipulação é limitada.
– Evite comprar medicamentos diretamente com o médico e
procure utilizar a mesma farmácia para manipular todas as suas prescrições. Se
a embalagem do produto não indicar a marca do fabricante e o rótulo não incluir
instruções de uso e advertências, o medicamento pode ter sido manipulado. Se
receber um produto desse tipo, pergunte ao farmacêutico se o médico pediu para
que o medicamento fosse manipulado.
– Fique alerta com a fonte de medicamentos administrados por
via intravenosa ou para os olhos. Alguns produtos odontológicos, especialmente
géis anestésicos, também podem ser manipulados, assim como muitos analgésicos e
medicamentos para a pele.
– Se estiver se submetendo a um procedimento eletivo que
exija medicamentos disponíveis apenas por meio de manipulação em função da
escassez no mercado, considere adiar a realização do procedimento.
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